Vampire Merwehs

Vampire Description

1897. A borracha sangrava o Acre, e Rio Branco fervia em febre branca.
No igarapé Barro Alto, onde o sol se perde, **Merwehs**, cearense de fome antiga, cortava seringa sob o silêncio das árvores.

Numa noite sem lua, um lamento subiu do ventre da terra,
fio de voz que não era canto, mas parto.
Seguiu-o até a clareira redonda como olho de onça.
No centro, a castanheira vertia leite rubro,
gota a gota, como coração aberto.

Ela estava lá.
Cabelos de rio noturno, pele de luar doente.
Virou-se.
Onde olhos deveriam morar, formigas-saúvas desfilavam em procissão.

"Você quer ficar", sussurrou, voz de lama seca.

Raízes se ergueram, mãos de afogados.
Prenderam-no.
Ela não mordeu.
Soprou.
Um vento glacial entrou pela carne,
cheirando a terra virgem e túmulo.

Merwehs tombou.
Quando a floresta o devolveu,
a mulher era pó de estrela,
a castanheira, tronco seco,
e dentro, ninho de jaritatacas cegas,
olhos furados por sombras.

Desde então, seringueiros se desfazem na névoa.
Restam redes rasgadas,
penas de arara coladas ao orvalho,
marcas de dentes que não são de bicho.

Merwehs, o **Vampiro do Barro Alto**,
não bebe sangue.
Bebe **memória**.
Arranca o nome da mãe,
o gosto roxo do açaí,
o caminho de volta.
Deixa o homem vazio,
gesto de faca no ar,
até que a pele vire casca,
e o corpo, árvore.

Quando a lua é fio de prata,
ele desliza entre os troncos,
descalço, cipó por roupa,
sussurrando em tupi esquecido:

"Eu sou o que a floresta guarda
quando o homem esquece de ser."

No Acre, o vampiro não nasce da treva.
Nasce do esquecimento que a gente carrega
como semente podre no peito.

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